Trabalhei quase trinta anos em indústrias e agora estou
professor. Digo estou porque o verbo ”
ser” dá uma idéia de longo prazo e na realidade meu contrato com a Secretaria
Estadual da Educação só vai até 23 de dezembro. Depois disso não sei quais
ventos me conduzirão e nem a qual destino.
Optei em transferir-me de um cenário de grandes transformações
para um cenário a meu ver mais calmo e importante, embora mal remunerado,
acreditando sinceramente que atuar no magistério pudesse contribuir para a
melhoria da qualidade de vida das pessoas da região na qual nasci .
No entanto, algo gritante tem me chamado a atenção nessa
nova atividade: a grande defasagem entre o tempo atual e o ponto em que se
encontra a escola pública paulista. Isto pode ser visualizado comparando a escola
pública paulista com a indústria, seja ela brasileira ou transnacional.
Tomaremos a situação apenas sobre alguns aspectos :
Tecnologia, Relações Humanas, Sistema de Gestão e Conteúdo .
Em termos de Tecnologia, a escola de hoje é quase a mesma de
30 anos atrás, senão vejamos. Ainda se usa giz , lousa e apagador. O controle
de freqüência ainda é feito no Diário de Classe, o mesmo dos meus tempos de
ginásio (tenho 54 anos de idade) , no qual o professor usa uma caneta e
preenche cada quadradinho de uma folha quadriculada a cada aula para cada
aluno. O controle de notas também continua da mesma forma, embora agora tenha alguns
diferenciais: ninguém pode ser reprovado, pois isso significa menores bônus
para professores,coordenadores e
diretores .Também existe agora um retrabalho de digitação para alimentar o sistema
geral da secretaria estadual ,que de fato é o que vale (embora com infinitos
erros gerados pela multiplicidade de meios geradores da mesma informação ) Cabe
salientar que nos tempos remotos não havia bônus e só passava quem de fato tinha
aprendido.
Na indústria de hoje os controles são todos informatizados.
É cômico imaginar uma fábrica moderna controlando o ponto de seus funcionários
manualmente e com todo o retrabalho que se vê na escola. Controle do
professor,controle da secretaria, controle do sistema, controle do coordenador,
etc...
Os conservadores de plantão hão de argumentar prontamente
que faltam verbas para investir nas modernas tecnologias, o que não é verdade. O
que na realidade falta é visão de quem administra estas verbas. A
informatização de uma escola custaria muito pouco e se pagaria rapidamente .
Imaginem uma roleta na entrada da escola, em que funcionários, alunos e
professores passariam os seus crachás e automaticamente fossem registradas suas
presenças, alimentando em tempo real, os
sistemas de informações, gerando as folhas de pagamento , os controles de
freqüência dos alunos e muitas outras informações. Quantas horas de trabalho
burocrático dos professores e das secretarias abarrotadas de gente seriam
economizadas. A instalação de câmeras em pontos estratégicos também poderiam reduzir
a necessidade de inspetores além de melhorarem a qualidade do serviço . A utilização
de lousas digitais agilizariam o processo de apresentação dos conteúdos ,facilitariam
a aprendizagem e eliminariam as improdutivas aulas de reforço realizadas nos
refeitórios e nos pátios por falta de salas.
Com relação a defasagem tecnológica, talvez também valha a
pena comentar que as salas de informática instaladas nas escolas já há alguns
anos não ajudam em quase nada na aprendizagem. Primeiro, porque muitas delas
não funcionam por falta de manutenção, e também em virtude do despreparo dos
professores para o seu uso. A verdade é que ao contrário da indústria na qual
os conhecimentos de informática são indispensáveis, na escola pouquíssimos
professores sabem operar computadores.
Focando as Relações Humanas, embora devesse ser a escola o
principal centro de referência, gerando padrões de conduta para a sociedade, o
que se vê são políticas antigas e inadequadas
a realidade atual . Em vez de fortalecer as relações pessoais baseadas na
inteligência emocional e no trabalho de equipe ,o que se vê é um individualismo
exagerado em que cada um quer fazer da sua maneira, não havendo interação entre
as pessoas e nem se acatando sugestões de melhoria dos métodos. Assim sendo,
não ocorre a formação de um time coeso e
produtivo. O que se vê são condutas protecionistas de acordo com as “panelas”
formadas por grupos que vão surgindo naturalmente de acordo com as semelhanças
de caráter. Isso prevalece inclusive nas atribuições de aulas pelos diretores.
Sei que os defensores dos métodos atuais hão de dizer que
hoje os alunos têm liberdade e que o professor não é mais o ditador autoritário
de antes. Concordo com isso e que de fato a democracia é melhor que a ditadura,
porém ainda faltam controles e parâmetros de conduta para todos os envolvidos .
A verdade é que cada um faz do jeito que quer.
Enquanto na Gestão Moderna das Empresas, se multiplicam e
sofisticam cada vez mais os Sistemas de Qualidade com métodos simples, enxutos
e organizados que garantem a qualidade dos produtos ou serviços, na escola
estes não existem. A abordagem dos problemas é quase sempre errônea, sem
investigação das causas. Com isso as soluções não passam de “eliminação de
incêndio”, e com certeza eles voltarão a acontecer. Faltam ações corretivas e
preventivas para que os problemas não mais ocorram. Cabe salientar que isto é
válido para tudo que envolve a escola: a disciplina dos alunos, a conduta dos
professores e funcionários a manutenção
dos equipamentos etc . A “gambiarra” impera na escola.
Completando esta análise comparativa vamos falar dos
conteúdos dos currículos, daquilo que se ensina na escola. Também existe uma
distância grande entre o que a escola passa e o que de fato se utiliza na vida
prática. Nas aulas de matemática, por exemplo, se aprende sobre tabelas
logarítimas e leis trigonométricas, porém ninguém sai da escola sabendo controlar
os próprios gastos. O brasileiro médio não sabe poupar e nem mesmo gastar menos
do que ganha. Vive endividado, com o saldo do cartão de crédito, do cheque
especial ou da conta da mercearia sempre estourado. Nas aulas de geografia ele
aprende sobre os continentes, porém mal sabe consultar um mapa ou seguir um
guia. Nas aulas de língua portuguesa aprendem sobre literatura clássica porém poucos
conseguem identificar as características meramente comercias das novelas da
televisão . Enfim falta ao conteúdo ensinado na escola uma equiparação ao
sistema de vida atual em que a tecnologia e a comunicação imperam.
Assim sendo, resta-nos concluir que é necessária uma
revolução geral na educação. Um choque de modernidade nas instalações, nos
sistemas e principalmente nas pessoas que
trabalham nesse meio. É preciso
sair do meio comum e interagir com os outros setores e com as comunidades
internacionais, mesmo porque na educação perdemos até mesmo apara nossos
vizinhos sul-americanos. Enfim está na hora de sair dessa toca.
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